O discurso da prefeita Márcia Conrado (PT), proferido durante o tradicional desfile cívico de comemoração pelos 174 anos de emancipação política de Serra Talhada, foi marcado por um tom enfático de defesa da sua gestão, num momento em que os ventos políticos já não sopram mais com a mesma intensidade a seu favor. A fala da gestora se deu dias após a divulgação de uma pesquisa do Instituto Múltipla que apontou queda significativa de sua popularidade — de 82% para 62% de aprovação — além de registrar a crescente ascensão de seus principais adversários políticos.

Ao discursar, Márcia adotou uma retórica de enfrentamento, buscando deslocar o foco das recentes denúncias e dos números desfavoráveis para uma mensagem de estabilidade e continuidade. “Não vamos permitir que as discussões sobre disputas políticas do próximo ano atrapalhem os avanços de Serra Talhada”, afirmou. A frase, embora soe como uma reafirmação de compromisso, pode ser lida também como uma tentativa de deslegitimar as críticas que vêm sendo feitas à sua gestão, principalmente em relação ao não repasse de valores dos empréstimos consignados de aposentados da educação, e os atrasos de pagamento a trabalhadores terceirizados.

DEFESA DA GESTÃO VERSUS REALIDADE EXPOSTA POR DENÚNCIAS

Ao insistir que “os mesmos que diziam que Serra Talhada nunca resolveria os problemas são os mesmos que se calam quando nós resolvemos”, Márcia constrói a figura do “inimigo externo”, uma estratégia recorrente em momentos de crise política. Essa retórica busca criar um antagonismo entre a gestão e os “profetas do apocalipse”, termo usado para se referir aos opositores e críticos. No entanto, ao ignorar publicamente denúncias graves — como o endividamento forçado de professores aposentados e a falta de salário de terceirizados —, o discurso pode passar a impressão de desconexão entre o poder público e a realidade concreta vivida por parte da população.

UNIDADE SIMBÓLICA E USO DO CAPITAL POLÍTICO

A prefeita também fez questão de citar aliados — como o vice-prefeito Faeca Melo e o deputado federal Fernando Monteiro — para demonstrar coesão política. Fernando, inclusive, é o nome que conta com o apoio da prefeita para a reeleição à Câmara Federal. Porém, segundo a pesquisa do Instituto Múltipla, aparece com apenas 12% das intenções de voto — muito atrás de Miguel Duque, filho do deputado estadual Luciano Duque, que lidera com 49%. O dado aponta uma clara preferência do eleitorado por um nome que simboliza renovação dentro da oposição e expõe o enfraquecimento da influência da prefeita na disputa por Brasília.

No mesmo levantamento, o deputado estadual Luciano Duque aparece como favorito para a reeleição com 55% das intenções de voto. Já Breno Araújo — esposo da prefeita e nome lançado como pré-candidato com apoio natural de Márcia — figura com apenas 9%. O contraste revela não apenas um desafio eleitoral para o grupo governista, mas também o risco de desgaste pessoal da própria prefeita, que tenta emplacar um nome da família em meio a uma crise de imagem da gestão.

GESTÃO À PROVA: ENTRE A PROMESSA DO FUTURO E AS FALHAS DO PRESENTE

Ao afirmar que “todo líder político tem que aprender a lidar com o sentimento do seu público”, Márcia admite, de forma indireta, que há uma percepção negativa em curso — mas tenta contorná-la ao reafirmar que Serra Talhada quer seguir crescendo. A grande questão que permanece, no entanto, é se as promessas do futuro serão suficientes para apagar as dificuldades atuais, como o colapso da gestão de folha de pagamento e o desgaste causado por denúncias que atingem aposentados e trabalhadores da cidade.

POR FIM

O discurso de Márcia Conrado, ainda que bem articulado e sustentado por uma narrativa de continuidade e resiliência, escancara uma tentativa de reposicionar sua imagem pública diante de um cenário político que se mostra cada vez mais adverso. A fala representa, sobretudo, um esforço para manter o controle da narrativa em meio a uma tempestade de fatos concretos que colocam sua gestão sob pressão.