A situação fiscal dos municípios brasileiros atingiu seu pior patamar em décadas no ano passado, com um déficit de R$ 17,9 bilhões. Isso comprometeu a gestão de 50% dos municípios, que não tiveram receitas suficientes para prestar serviços públicos essenciais à população. Em 2022, esse percentual foi de 36%. Esses dados foram revelados pelo estudo “O Contexto da Crise Fiscal nos Municípios”, realizado pela Confederação Nacional de Municípios (CNM), que destaca o agravamento da crise nas prefeituras de todas as regiões do país.

O levantamento detalha as medidas adotadas pelos gestores para enfrentar a crise e os fatores que continuarão a pressionar os municípios. O estudo também oferece uma análise das causas da crise sob a perspectiva da Previdência Social, da defasagem dos programas federais, das obras paradas e das dívidas da União com os municípios.

O agravamento da crise resulta da combinação da redução de receitas de transferências e do aumento progressivo das despesas públicas no cenário pós-pandemia e da deterioração do pacto federativo. As principais fontes de gastos identificadas foram o pagamento de pessoal, investimentos e despesas com custeio de programas.

O desempenho dos limites de gastos com pessoal em relação à Receita Corrente Líquida (RCL) dos municípios aumenta a preocupação da administração local neste ano. As despesas de custeio – recursos destinados à educação, assistência social e saúde – superaram o volume de gastos de pessoal em 2023. As despesas de custeio (+13,2%) e de pessoal (+2,2%) explicam quase 41% dessa expansão. O investimento público aumentou em 29,7%, o que representa um incremento de R$ 24,7 bilhões.

O estudo também destaca a criação de vagas na área social dos municípios. Desde 2010, houve um crescimento de 1,7 milhão de ocupações, das quais 1,27 milhão foram destinadas à área social e 461 mil para outras áreas da administração.

A previdência é apontada como um dos principais desafios, sendo uma das pautas prioritárias da CNM. Cerca de 81% dos municípios têm débitos com o INSS, que superaram R$ 248 bilhões em 2023. Somadas às dívidas do RPPS, o total ultrapassa R$ 312,6 bilhões. Em resposta, a CNM apresentou um texto, protocolado como Emenda de Plenário 6 à Proposta de Emenda Constitucional (PEC 66/2023), que inclui medidas como a desoneração permanente da folha de pagamento e o parcelamento especial das dívidas junto ao RGPS e RPPS.

O estudo também aborda o subfinanciamento dos programas federais. Até abril de 2024, há previsão de continuidade e custeio para 196 políticas públicas federais, sendo a maioria na Saúde (120), seguida pela Educação (39) e Assistência Social (32). Os municípios frequentemente precisam complementar os recursos, aplicando valores significativamente maiores do que os repassados pela União.

Outro ponto crítico são as obras paradas. Desde 2007, existem 7.555 obras paradas em 2.661 municípios, representando um valor contratado superior a R$ 36,1 bilhões. A maior parte das obras paradas está na educação (66%), seguida pela saúde (26%). Há uma discrepância de mais de R$ 9,2 bilhões entre o que foi empenhado e o que foi pago pelo governo federal para a conclusão dessas obras.

As dívidas da União com os municípios também são significativas. Entre 2014 e 2022, os recursos destinados e não pagos para o financiamento do Sistema Único de Assistência Social (Suas) e as obras educacionais somam R$ 62,1 bilhões.

Para enfrentar esses desafios, a CNM defende a aprovação de diversas medidas, incluindo a Emenda 6 à PEC 66/2023, que representaria mais de R$ 500 bilhões em conquistas para os municípios. Outras prioridades incluem a PEC 25/2022, que adiciona 1,5% ao Fundo de Participação dos Municípios (FPM) em março de cada ano, e a PEC 40/2023, que propõe a elevação do FPM. A CNM também apoia a PEC 14/2023, que atualiza monetariamente os repasses de programas federais, e o Projeto de Lei Complementar (PLP) 98/2023, que exclui contratações por meio de Organizações Sociais do cômputo dos gastos com pessoal.